sexta-feira, 5 de junho de 2009

Fugir do extremo da equivocidade


Devemos fugir do extremo da equivocidade. Se a univocidade cai no engano de afirmar a identidade entre o ser e o conhecer, abraçando um dogmatismo intransigente, o extremo oposto da equivocidade exprime a atitude de fria indiferença de quem afirma a cesura entre o ser e o conhecer. Quando partimos da postura de que em nosso conhecimento não há nada que mereça confiança, ou até de que este nada tem mesmo a ver com a realidade, nos rendemos ao ceticismo. Parece-nos que diante do espetáculo incômodo e desorientador da profusão de pontos de vista, da diversidade de ideologias divergentes e irreconciliáveis, da multiplicidade de posições em conflito, devemo-nos refugiar na atitude de suspensão total de qualquer juízo. Se tudo depende do arbítrio subjetivo, todos os juízos valem o mesmo e valem nada – em última instância, nenhum valor seguro de verdade poderemos encontrar em qualquer deles. Goza-se assim de uma “tranqüilidade ilusória e mortuária” que condena a priori ao fracasso o que há de mais autêntico, permanente e nobre no homem, que é sua busca apaixonada da verdade. Não deve o homem, ao contrário, alienar-se de si e do mundo, dispensando o valor, mesmo parcial, das mediações da Palavra e da razão analítica no acesso à realidade. Devemos ser mais humildes que a univocidade mas mais confiantes que a cética e estéril equivocidade, não renunciando a convocar nossa potência interpretativa – crítica e, por isso, autocorretiva e superadora de si – no trato com o real.

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